domingo, 12 de junho de 2011

A INTUIÇÃO COMO MÉTODO DA FILOSOFIA III

A INTUIÇÃO ESPIRITUAL.
Se não houvesse mais intuição que a intuição sensível, a filosofia ficaria muito mal servida.
Mas é o caso que há na nossa vida psíquica outra intuição além da intuição sensível. Existe, digo, outra intuição que, desde já, antes de trocar-lhe o nome, vamos denominar "intuição espiritual". Assim, por exemplo, quando eu aplico o meu espírito a pensar este objeto: "Que uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo", vejo sem necessidade de demonstração (a demonstração é discurso e conhecimento discursivo), com uma só visão do espírito, com uma evidência imediata, direta e sem necessidade de demonstração, que uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo. O princípio de contradição, como o chamam os lógicos, é, pois, intuído por uma visão direta do espírito, é uma intuição.
Quando eu digo que a cor vermelha é distinta da cor azul, esta diferença entre o vermelho e o azul, vejo-a também com os olhos do espírito mediante uma visão direta e imediata. Eis um segundo exemplo de uma intuição que já não é sensível. É sensível a intuição do vermelho, é sensível a intuição do azul, porém a intuição da relação de diferença — a intuição de que o vermelho é diferente do azul — essa já não é uma intuição sensível, porque seu objeto, que é a diferença, não é um objeto sensível, como o azul e o vermelho.
Quando eu digo que a distância de um metro é menor do que a distância de dois metros, esta diferença, esta relação, é o objeto de uma intuição e não é um objeto sensível.
Por conseguinte a intuição, que estes exemplos nos descobrem, não é uma intuição sensível. Existe, pois, uma intuição espiritual, que se diferencia da intuição sensível em que seu objeto não ó um objeto sensível. Esta intuição tampouco se faz por meio dos sentidos, mas por meio do espírito.
Até agora vou falando do espírito em geral, sem maior precisão. Mas agora é preciso ir depurando, purificando, esclarecendo mais esta noção que já temos da intuição.
Se considerarmos os exemplos com que ilustramos esta intuição espiritual, dar-nos-emos conta imediatamente de que eles nos colocam diante de um gênero de objetos que são sempre relações, e estas relações são de caráter formal. Referem-se à forma dos objetos. Não ao seu conteúdo, mas a esse caráter, por assim dizer, exterior, que todos os objetos têm de comum: a dimensão, o tamanho etc. Então, por meio da intuição espiritual, no sentido em que a empregamos até agora, percebemos diretamente, intuímos diretamente formas dos objetos: ser maior ou ser menor; ser grande ou ser pequeno em relação a um módulo; poder ser ou não ao mesmo tempo. Mas todas estas são formalidades.
A intuição espiritual nos exemplos que acabo de oferecer é, pois, uma intuição puramente formal. Se não houvesse outra na -vida do filósofo, mal andaria ele. Se não pudesse ter mais intuições que intuições formais, também não poderia construir a sua filosofia porque com simples formalismos não se pode penetrar na essência, na realidade roesma das coisas, como o filósofo pretende mais do que nenhum outro pensador.
Porém, há na vida do filósofo outra intuição que não é puramente formal, há outra intuição que, para contrapô-la a intuição formal, chamaremos "intuição real". Há outra intuição que penetra no fundo mesmo da coisa, que chega a captar sua essência, sua existência, sua consistência. Esta intuição que vai diretamente ao fundo da coisa é a que aplicam os filósofos. Não uma simples intuição espiritual, mas uma intuição espiritual de caráter real, por contraposição à intuição de caráter formal a que antes me referia. E esta intuição de caráter real, esta saída do espírito, que vai tomai contacto com a íntima realidade essencial e existencial dos objetos, esta intuição real, podemos, por sua vez, dividi-la em três classes, segundo predomine nela, ao verificá-la, por parte do filósofo, a atitude espiritual, ou a atitude emotiva, ou a atitude volitiva.

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