domingo, 12 de junho de 2011

A INTUIÇÃO COMO MÉTODO DA FILOSOFIA VIII

A INTUIÇÃO EM HUSSERL.
Por último, direi algumas palavras sobre a intuição fenomenológica de Husserl.
A intuição fenomenológica de Husserl, para caracterizá-la em termos muito gerais, e, por conseguinte, muito vagos, teria que ser relacionada com o pensamento platônico. Husserl pensa que todas as nossas representações são representações que devemos  olhar de dois pontos de vista. Desde logo, um ponto de vista psicológico segundo o qual têm uma individualidade psicológica como fenômenos psíquicos; todavia, como todos os fenômenos psíquicos, eles contêm a referência intencional a um objeto.
Cada uma de nossas representações é, pois, em primeiro lugar, uma representação singular. Em segundo lugar, esta representação singular é o representante, o mandatário, diremos, de um objeto, Assim, se eu quero pensar o objeto Napoleão, não posso pensá-lo de outra maneira que representando-me Napoleão, mas a representação que eu tenho de Napoleão terá que ser singular: ora imagino-o montado a cavalo na ponte de Arcole, ora suponho-o na batalha de Austerliz, com a cabeça baixa e a mão enfiada na sua túnica; ora figuro-o desesperado, após a derrota de Waterloo. Cada uma dessas representações por si mesma é singular; mas as três, embora sejam totalmente distintas umas das outras, referem-se ao mesmo objeto que é Napoleão.
Pois bem: a intuição fenomenológica consiste em olhar para uma representação qualquer, prescindindo de sua singularidade, prescindindo ,do seu caráter psicológico particular, colocando entre parente ses a existência singular da coisa; e então, afastando de si essa existência singular da coisa, para não procurar na representação senão aquilo que tem de essencial, procurar a essência geral, universal, na representação particular. Considerar, pois, cada representação particular como não particular, colocando entre parênteses, eliminando de nossa contemplação, aquilo que tem de particular, para não olhar senão aquilo que tem de geral; e uma vez que conseguirmos lançar o olhar intuitivo sobre aquilo que cada representação particular tem de geral, teremos nessa representação, embora particular, plasticamente realizada a essência geral. Teremos a idéia, como ele diz, renovando a terminologia de Platão, e por isso se trata aqui, para Husserl, de uma intuição do tipo que denominamos intelectual.
Temos, pois, em linhas gerais aproximadamente o seguinte: que Bergson nos representa a intuição de tipo emotivo; que Dilthey nos representa  a intuição  existencial  volitiva;  e  Husserl  representa  a intuição intelectual à maneira de Platão ou talvez também à maneira de Descartes.

Para terminar, é conveniente que tentemos extrair dessa análise que fizemos da intuição, algumas conclusões pessoais para nosso estudo da filosofia, para nossas excursões no campo da filosofia.
É preciso considerar que estas três classes de intuição que se repartem em grandes linhas o campo metódico filosófico contemporâneo têm, cada uma delas, sua justificação num lugar do conjunto do ser. O erro consiste em querer aplicar uniformemente uma só delas a todos os planos e a todas as camadas do ser.
Evidentemente, nas camadas do ser que estão dominadas pela construção intelectual das ciências matemáticas, físicas, das ciências biológicas, das ciências jurídicas e sociais, aquelas camadas onde o ser
significa já, sem preocupar-se da origem delas, existência e essência, nessas camadas o importante, o filosòficamente importante é a descrição das essências. Fazer descrição daquilo que os objetos são.
Para estas camadas do ser, evidentemente, a intuição fenomenológica de Husserl é o instrumento mais apropriado; a intuição intelectual é aquela que, tendo nós posto o objeto diante de nós, submete o às categorias do ser estático, do ser existente; o método mais eficaz para esta camada de ser será evidentemente a intuição fenomenológica, que procura furar as representações desse ser, dessa coisa, para chegar à coisa mesma, prescindindo da singularidade e particularidade da representação.
Todavia, se o objeto que nos propomos captar for pré-intelectual, for essa vivência do homem antes que o homem tenha resolvido crer que há coisas, então teremos que descobrir essa vivência do homem, anterior à crença na existência das coisas, como um puro e simples viver, mas um viver que sente os obstáculos, que tropeça com resistência, com dificuldades. E justamente ao tropeçar com resistências e dificuldades, dá a essas resistências o valor de existências e, tendo-as convertido em existências, lhes confere o ser, e, uma vez que lhes conferiu o ser, então já são essências, às quais pode aplicar-se a intuição intelectual.
De sorte que estes três tipos de intuição não são contraditórios mas antes podem todos ser usados na filosofia contemporânea e nós os usaremos segundo as camadas de realidade em que estiverem situados os objetos a que nos consagramos. Em nossas excursões pelo campo da filosofia, seremos fiéis ao método da intuição, se umas vezes aplicarmos a intuição fenomenológica e outras a intuição emotiva, ou, melhor ainda, a intuição volitiva.

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